No silêncio da solidão

Naquela manhã, ele não estava nem um pouco animado para levantar da cama. A chuva torrencial que caía sobre a cidade o deixava com uma preguiça que não era de costume. Geralmente ele levantava antes mesmo que o despertador tocasse. Já se adiantava para não atrasar para o serviço.

Ele nunca se atrasava para o serviço, na verdade, ele sempre chegava adiantado, mas não era apenas para receber uma gratificação maior em seu salário. Na verdade, era porque ele se sentia mais a vontade em seu trabalho do que em sua casa. Lá ele poderia relacionar-se, poderia dar ordens aos seus subordinados... Sua vida estava ali.

E os comentários de seus colegas de trabalho a seu respeito não eram muito bons. O fato dele ser um homem de meia idade que morava sozinho, que nunca havia se casado e que pouco saía de sua casa, a não ser para trabalhar, gerava os comentários de todos aqueles que, na verdade, não gostavam de acatar as ordens de seu superior.

Ainda assim, ele trabalhava e preferia a empresa ao invés de seu lar. Sua casa era sempre tão silenciosa e vazia, enquanto naquele prédio da organização tudo andava com tanta vida e agitação que o animava, pouco, mas o animava.

Quando ele levantou da cama e olhou pela janela da cobertura do prédio, as nuvens davam uma trégua na batalha contra o sol e, em meio aos prédios e ruas que tonalizavam um degrade, destoava um arco-íris, trazendo vida a todo aquele cenário de rigidez e compromisso que as cidades têm.

Quando ele olhou para aquilo, por certo momento pensou em Deus, mas logo já esqueceu, afinal, se Deus realmente existisse estaria ocupado cuidando de assuntos maiores e melhores, e não teria tempo para as suas aflições e tristezas. Ninguém nunca o ajudara nas dificuldades da vida e, segundo ele, ninguém ajudaria.

Bateu, então, um sentimento tão grande de solidão, como já era de costume que ele sentisse. Ele estava só sobre a face da Terra e nada mudaria isso. Tudo o que ele possuía perdera o valor naquele instante; tanto dinheiro que não conseguira comprar sua felicidade e satisfação. Tão rico e tão pobre.

A única coisa que o consolava era pensar que todos os homens fossem assim. Para ele, embora todos queiram passar uma aparência de felicidade, ninguém era feliz de verdade. Na realidade, todos estavam sempre mascarados, sempre maquiados com longos sorrisos, trazendo em seus corações longas tristezas.

A este ponto ele já estava trocado. Trajado de terno risca-de-giz, sapatos italianos e uma gravata verde que ele nunca gostara, mas que às vezes usava. O relógio trazia a hora certa e o motorista já o esperava no subsolo, como o motor do carro ligado. Quando ele entrou no elevador, uma dor súbita invadiu o seu abdômen e subiu-lhe ao peito, de tão forte que ele sua visão embaçou e escureceu.

Quando acordou já estava na cama de um hospital importantíssimo, pois funcionários do prédio o acharam e acionaram a ambulância, enquanto outros o carregaram até a portaria, à espera da ambulância. Embora estivesse consciente, a dor permanecia a atravessar-lhe o peito.

Os médicos já havia se prontificado a fazerem exames de rotina, para saberem a causa do desmaio de tamanha dor. Em poucas horas o diagnóstico saiu: ele estava com os rins tomados de um cisto e precisaria de um transplante urgente.

Ele não sabia como isto havia acontecido, já que realizava os exames periodicamente, que não traziam nenhuma alteração, e ele não havia sentido nada antes daquele dia. Mesmo assim, os resultados não mudavam, precisava de um rim e não podia perder tempo.

Aqueles dezesseis dias foram horríveis, nada parecia conter a sua dor, e não achavam um, pois não tinha nenhum parente próximo e não achavam quem doasse um rim. Até que, naquele dia, uma pessoa apresentou-se no hospital, dizendo que gostaria de doar seu rim, com a condição de conversar com paciente antes da doação.

Aquela notícia fora recebida com muita alegria, embora tenha soado um tanto bizarro. Os médicos já conduziram a pessoa a fazer exames prévios para saberem se seria possível a doação e tudo estava bem: o transplante seria realizado. Então conduziram-na para que conversasse com o paciente.

Ele estava meio ansioso, não sabia o que esta pessoa iria dizer-lhe, quando viu as enfermeiras trazendo uma mulher. Ela era baixa, tinha os cabelos de um tom loiro natural, aparentava ter de 30 a 32 anos de idade. Ela chegou-se perto dele, abraçou-o e disse:

- Tudo bem, fique tranquilo, daqui a poucas horas tudo estará terminado. Antes mesmo que ele perguntasse ela disse: eu estava em um culto, em minha igreja, orando a Deus pedindo a Ele maneiras de demonstrar o Seu amor que habita em mim. Quando Deus falou comigo e disse-me o que eu deveria vir aqui, e dizer que deveria fazer a doação de rim para o paciente que necessitava.

-Ele disse também, ela continuou – que eu deveria vir até você e dizer-lhe que Jesus te ama, deu Sua vida para te salvar, que Ele conhece os teus pensamentos e a tristeza que habita em você, mas que Ele é a cura para tudo isso e a verdadeira riqueza que um homem pode ter.

Naquelas palavras tão simples estava toda a sabedoria. Ele não teve palavras para respondê-las, até que as enfermeiras chegaram e conduziram para a preparação para o transplante, assim como o conduziram também. Tudo ocorreu bem, a operação foi um sucesso, e a recuperação também.

Logo, foi dado alta para ele e para ela, então eles combinaram de tomarem café da manhã juntos, para conversarem melhor. Quando já estavam assentados, ele não conteve e perguntou-lhe:

- Deus realmente falou com você? Mas é claro, ela já respondeu. Você acha que eu mentiria para você, neste assunto tão serio? Ele falou-me e eu obedeci. E de onde veio esta coragem? – Ele replicou.

 Não sei. Deus apenas nos desafia a provarmos o seu amor todos dias, mesmo que não sejam em situações assim, mas Ele nos desafia. Muitas pessoas não creem em Deus porque dizem não vê-lo. Porém, a missão de mostra-Lo ao mundo pertence aos Seus filhos, brilharmos a luz em meio às trevas.

Ele então refletiu e disse: gostaria de poder agradecer a Deus pelo que Ele fez por mim, e pedir perdão por tantas vezes nega-Lo. Mas isso é fácil, disse ela; entregue sua vida ao Salvador, Jesus Cristo, e viva para Ele, refletindo o Seu amor em todos os lugares, em todos os momentos.

Deus abençoe!!