A cidade estava movimentada aquela tarde. Uma chuva serena caia sobre os prédios e salpicava o asfalto, fazendo com que os carros que ali passassem ecoassem o som dos pneus sobre a água e espargissem gotículas de água ao derredor. Alguns ainda ousavam em deixar o guarda-chuvas aberto, mas é certo que ninguém ficaria densamente molhado com a pouca água de descia do céu.
Passos pra lá, carros pra cá, ônibus lotados e algumas mentes vazias. Na esquina de um alto prédio que destacava-se por sua importância econômica na cidade, estava um homem bem vestido: terno importado preto, sapatos de couro bem lustrados, uma maleta na mão, que talvez contivesse documentos importantes para inúmeras pessoas, e um sobretudo marrom.
Ali, parado na esquina, ele conferia impaciente ao relógio enquanto via atravessar pela avenida mais um táxi ocupado. Passava as mãos no cabelo grisalho, voltava a olhar para o relógio, voltava a passar mais um táxi com passageiros. Isso já estava começando a incomodá-lo, qualquer um que o visse perceberia a pressa exposta em seu rosto.
De repente, o homem levantou a sua mão, finalmente sua condução. O carro aproximou-se e duas mãos alcançaram a porta. Um humilde rapaz, de pouco mais de vinte anos. O homem olhou para o rapaz, que trajava roupas simples.
Por um momento, o homem rico sentiu-se tentado a ignorar a atitude do outro, tomar o táxi e partir sem dar satisfação, mas retomou a paciência. Trocaram poucas palavras com a porta do carro ainda aberta, e decidiram compartilhar a viagem, o destino dos dois era o mesmo. Já dentro do táxi, lado a lado, o jovem decidiu agradecer a atitude de boa vontade que lhe fora prestada.
- Muito obrigado, Deus abençoe sua vida e que o Senhor Jesus retribua a sua ajuda! Você não sabe como isso é importante pra mim.
O homem rico olhou sarcasticamente para o lado, incomodado, analisando as palavras e de onde elas tinham vindo: um rapaz humilde, que não aparentava ter dinheiro, e talvez não tivesse estudo também; e que mesmo assim, ousava em falar-lhe de Deus. Pareceu-lhe muito engraçado para ser verdade.
- Disponha – ele respondeu – mas não vou precisar da bênção desse seu Deus e nem da retribuição de seu Cristo. Sabe, se eu puder lhe ensinar algo, esta lição seria: desapegue do “mito”. Deus não existe, meu caro rapaz, e crer que Ele exista não irá fazer com que as situações melhorem. Viva a realidade. Em milhares de anos em que as religiões existem, nunca puderam comprovar a existência dos deuses; quem seria esse seu Deus tão melhor e mais forte? Quer ver algo? Se Deus existe, Ele que me prove agora!
Nesse momento, o homem gargalhou alto, e prosseguiu:
- Milagres não acontecem porque Deus não existe, as coisas são simplesmente porque são. E não é porque sua vida é difícil que você pode esperar dos céus a ajuda, espere de si mesmo. Não espere o socorro dos céus, olhe para dentro de si. Nós somos os deuses, meu amigo, nós podemos fazer aquilo que quisermos fazer, com nossas forças e capacidade. Somos seres espetaculares, não precisamos de Cristo.
O rapaz ouviu calmamente, parecendo ser bem receptivo, até que perguntou-lhe:
- Você tem filhos? – O homem rico esboçou espanto no rosto pela pergunta que lhe fora feita, mas logo entendeu: Ah - respondeu – nem me venha com a velha história do Filho de Deus morrendo pelos pecadores. Eu não darei crédito, pode desistir.
- Não foi esta a pergunta que eu lhe fiz! Você tem filhos – Agora o rapaz disse já em tom de autoridade.
- Ora, isso não convém!
- Já percebi que tem. Você daria seu filho para morrer por mim, senhor?
- O que? Ah, que ridículo!
- Bem, você não é Deus? Creio que exista muita bondade dentro de você para dizer que é Deus! Por que você não oferece seu filho por mim então? Eu preciso de um transplante de coração, porque você não doa o coração de seu filho por mim? Você não é Deus, faça por mim!
- Escute aqui, seu moleque audacioso... – Ele gritou, e nem terminou a frase, foi interrompido:
- Audacioso eu?! Você que pede um sinal dos céus, fazendo Deus de seu empregado, como se Ele existisse só pra te servir e eu sou o audacioso? Ah... Eu acho que o senhor está enganado.
- Ah, por favor! Não preciso ficar ouvindo isto. Taxista, pode para este carro agora, que este rapaz louco vai descer aqui – Gritou o homem rico em tom de autoritarismo ao motorista do taxi, que ouvia tudo em silêncio. Mas o rapaz continuou:
- Eu vou provar ao senhor que Deus existe. Eu estava no centro quando recebi o telefonema do hospital, dizendo que chegara a minha vez para o transplante e que eles tinham um coração, mas que era uma corrida contra o tempo. Fiquei desesperado, mas não tinha nada a fazer, a não ser esperar um ônibus, que ainda assim iria parar a duas quadras do hospital...
Nesse momento o táxi parou, e o rapaz continuou:
- Orei a Deus e Ele me disse para achegar mais próximo do táxi. Sim, Ele disse dentro de mim isso. Acheguei-me e, como o senhor pôde perceber, estamos parados em frente ao hospital. Milagres acontecem sim, e o senhor hoje acabou de ser usado por Deus num deles.
O rapaz desceu do táxi e fechou a porta sem olhar para trás, deixando no banco traseiro a sua parte no dinheiro e um homem perplexo. Ele olhou para aquele dinheiro meio amassado e sentiu um ódio que nunca pensou ser capaz de sentir. Aquelas palavras eram tão fortes, tão verdadeiras e tão vivas dentro dele, mas ele insistia em repugná-las. Ele tomou o dinheiro que o rapaz deixar e lançou pela janela, de fúria.
O resto do percurso ele seguiu em silêncio. Esquecera o motivo da pressa, esquecera o motivo da viagem, não sabia nem mesmo quem ele era e qual o seu propósito. O táxi estacionou, ele pagou toda a viagem e esperou pelo troco já do lado de fora. O taxista tirou o troco, devolveu nas mãos do homem, e, com um sorriso no rosto, olhando nos olhos dele, disse:
Que lindo ! Nossa! Glória a Deus!!
ResponderExcluirGlória a Deus, que muitos venham entender a Verdade, para bênção própria de cada um...
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