Rick
organizava a mesa de jantar com suas coisas: caderno, estojo, notebook, café.
Logo mais, Maikão estaria ali com ele, pra montarem o planejamento do retiro
que seria apresentado ao conselho da Igreja. O planejamento deveria responder as
perguntas mais cruciais, tipo: “onde realizar”, “quanto gastar” e coisas assim,
e deveria ser bem claro, pra não deixar dúvidas no ar, o que poderia atrapalhar
o conselho de aprovar a ideia.
Estava
tudo quase pronto. Rick tomou o celular e discou para Pedro. Já estava ficando
impaciente de esperar quando ouviu:
-
Fala mininu...!
-
Quase que eu não falo né? Levou um ano pra atender esse celular. Tava dormindo
ainda?
-
Arre égua! Tá apurrinhado, tá?
-
Que?! Olha, deixa pra lá... escuta, preciso da sua ajuda Pedro, tem como tu vir
aqui em casa, tipo agora?
-
Tem não, homi. Seria pra que?
-
Meu, a Igreja vai fazer um retiro de carnaval pra mocidade. Preciso de ajuda no
planejamento.
-
Ah Rick, vai dar não, estarei de viagem no Carnaval desse ano.
-
Ah não, você tá de brincadeira, né?
-
Claro que não, oxe! Painho, mainha... todo mundo aqui em casa vai pra Fortaleza
ver a família.
-
E você vai deixar o amigo aqui se virando sozinho?! Que pecado, hein Pedro!
-
Aff Rick! Pecado seria eu rejeitar uma viagem tão divina! Nem adianta tentar,
não tem jeito. As passagens estão até compradas.
-
Pois então eu desejo que seja uma boa, ótima, maravilhosa viagem, mas que você
fique com remorso de me abandonar, viu “amigo”?
Rick
desligou na cara de Pedro; ele adorava fazer essas chantagens emocionais.
***
-
Ai Camila, eu tô cansada. Tô trabalhando feito uma camela, e agora ainda tem
mais preocupação com essa história de retiro - Lorena falava com Camila pelo
celular enquanto ia pra casa do Rick.
-
Que retiro, amiga?
-
O retiro que a Igreja vai fazer no carnaval, pra mocidade. Nossa, o Maikão é
teu namorado e não disse nada?!
-
Ah tá, ele disse sim. Achei que você tivesse falado de outro retiro, sei lá...
-
Que outro retiro, Camila, deixa de ser lerda e pensa um pouco, pelamor.
-
Nossa Lorena, calma!
-
Ah... desculpa... eu ando muito estressada.
-
É, eu percebi. Mas por que você não negou ajudar nesse retiro?
-
Eu neguei, né? Mas aí Dona Vera foi lá em casa, me intimando pra participar,
não tive nem o que falar.
-
Fica calma, amiga. Tudo vai dar certo, tenho certeza.
-
Amém. Olha, preciso desligar, tô chegando na casa do Rick.
Lorena
desligou o celular e estava guardando na bolsa quando chegou frente a casa da
casa do namorado. Rick abriu o portão e saiu de casa sem olhar pra frente. Os
dois trombaram, tudo foi ao chão: notebook, celular, bolsa e o casal de
namorados.
-
Pô Rick, você não olha pra frente não?! -
Lorena o xingou.
-
Desculpa amor, eu ia ver se o Maikão tava chegando – Rick falava sem graça,
enquanto ajudava a namorada a pegar o que havia caído no chão.
-
Então presta mais atenção.
Lorena
guardou tudo na bolsa, que era daquelas grandes (que as mulheres usam), e já
foi entrando. Rick ficou parado alguns segundos e depois seguiu a namorada.
-
Lorena, o que você veio fazer aqui? Por acaso a senhorita está de assuntos
secretos com a Clarinha? – Rick falou, brincando.
-
Ai Rick, não viaja. Eu vim pro planejamento do retiro. Não é hoje que vocês vão
se reunir? O Maikão tinha dito que era hoje, nessa hora, na sua casa.
-
Tá, mas você tinha dito que não ia participar.
-
É, eu tinha né? Mas aí sua mãe foi lá em casa... meio que me obrigou a participar...
-
Hm... e por que você perguntou do planejamento pro Maikão, e não pra mim?
Dessa
vez, Rick cruzou os braços, e isso era sinal de que algo estava errado. De
fato, tinha algo errado. Se alguém entrasse naquela sala nesse momento, diria:
tem alguma coisa errada, pois tinha mesmo. Mas acho que já deixei claro que
tinha algo errado. Enfim. Voltemos ao diálogo dos namorados.
Antes
que Lorena pudesse responder, a campainha soou.
-
Rick, desencana. Vai lá atender, deve ser o Maikão.
Rick
saiu à contra gosto, e Lorena pensou: “salva pelo gongo.” Mas, afinal, salva de
que? A pergunta que Rick fez a deixou intrigada. Por que ela havia recorrido a
Maikão e não ao namorado? Por que ela estava fugindo de Rick. Ela não teve
muito tempo pra pensar, logo Rick voltou, e Maikão o acompanhava com sorriso de
orelha a orelha.
-
Lorenaaaa... hahaha... fico muito mais aliviado fazer tudo contigo, tu já
trabalha nesse ramo e tals... Deus ouviu minhas orações, hahaha... e você não
resistiu ao encanto do Rick, né?
O
silêncio reinou (esse som não é o de um grilo?). Maikão não entendeu o porquê
da piada não ter o surtido o devido efeito, afinal: eles não são namorados?!
Antes que o momento piorasse e situação ficasse mais chata, Lorena falou:
-
Então não vamos perder tempo, né? Olha, eu estive pensando: o planejamento deve
responder as perguntas mais cruciais, tipo: “onde realizar”, “quanto gastar” e
coisas assim, e deve ser bem claro, pra não deixar dúvidas no ar, o que pode
atrapalhar o conselho de aprovar a ideia.
-
Ué, eu tenho a impressão de ter lido isso em algum lugar – Rick falou,
indeciso.
-
Ah gente, que lindo ver vocês juntos – Dona Vera se aproximou do trio. Ela
cumprimentou Maikão e Lorena e continuou – se vocês precisarem de alguma ajuda,
estou à disposição.
-
Mãe, não vamos precisar de nada, a gente tá começando agora o planejamento.
-
Claro que vão precisar... Vocês já decidiram quem vai cuidar da cozinha, por
exemplo?
-
Ué, mãe, a dona Rosa. Ela sempre cuida da cozinha da Igreja.
-
É, meu filho, mas você está esquecendo que ela sempre viaja pra Fernandópolis
no carnaval pra ver a família do marido. Ou seja, vocês não tem ninguém... eu
poderia muito bem ficar responsável pela cozinha.
-
É... acho ótimo – concluiu Lorena – uma questão a menos a ser resolvida.
-
Formou então, velho!! – Maikão falou animado.
-
Maravilha! Sou uma ótima cozinheira, vocês não irão se arrepender – Dona Vera
saiu animada e deixou os três sozinhos novamente.
-
Então vamo lá... vamo fazer onde? – Maikão perguntou.
-
Que tal no clube “Ponto Chique” – Rick sugeriu.
-
Tá maluco?! Fechar aquele clube quatro dias é falir as famílias da Igreja –
Lorena disse indignada.
E
assim os três foram decidindo, propondo, mudando de opinião, voltando atrás...
enfim. Levaram a tarde toda no planejamento, até anoitecer, até mesmo porque
deve ser bem difícil fazer um planejamento desses (eu falo “deve ser” porque
nunca fiz um, então não posso garantir nada).
Mas
aconteceu de Maikão ir embora. Rick ofereceu carona a Lorena, que estava a pé,
pois seus pais estavam usando o carro da família. Eles forma no fusca de Rick até a casa dela. Rick parou bem em frente, e o
clima entre eles ainda estava estranho, tanto que ficaram em silêncio o caminho
todo.
-
Enfim, chegamos à sua casa – Rick finalmente tinha um motivo para falar algo.
-
Obrigada pela carona.
- Disponha – ele disse a acompanhando até a
porta da frente – olha só, chegamos naquele momento clichê da história, onde o
casal chega na porta da casa da garota.. hm... o que virá depois, hein?!
-
Que clichê, Rick? Eu tenho que entrar, ainda tenho coisa pra fazer, tá? Tchau –
ela falou, dando um selinho nele e entrando na sua casa.
Rick
ficou parado durante algum tempo, um tanto que frustrado. Realmente não era
isso que ele esperava que fosse acontecer, mas talvez ele colocasse expectativa
demais sobre as coisas e o erro fosse dele. De qualquer forma, ele subiu no
Fusca e voltou pra casa, esperando que as coisas pudessem melhorar daí pra
frente; ou ele estava colocando expectativas demais sobre as coisas de novo,
quem sabe?
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