A escada era estreita, e era impossível
de subir por ela duas pessoas lado a lado. Por um momento, Camilo chegou a
questionar a si mesmo com dona Jane, uma senhora de idade já avançada,
conseguia dar conta de tarefa tão trabalhosa.
- Já estou acostumada a essa escada
velha – a senhora disse, como que lendo os pensamentos do homem – vivi minha
vida toda dentro destas paredes velhas – a este ponto ela já terminara os
degraus e ajudava Júlia a subir os últimos; Camilo vinha logo abaixo – Quando
Onofre morreu, eu pensei em me mudar, mas é difícil largar assim do lugar onde
a gente passou a vida toda da gente.
A escada terminava num corredor também
estreito. Aos fundos dava pra ser que era um banheiro, a porta aberta
denunciava uma pia, e aos lados direitos havia três portas. Dona Jane, Julia e
Camilo pararam em frente à segunda porta. A senhora deu dois toques baixos e
abriu uma fresta.
- Madeleine, querida, os pastores estão
aqui para conversar com você.
Não ouviu-se um único ruído sair de
dentro do quarto, porém, de alguma forma, Madeleine permitiu que a avó deixasse
o casal entrar. Jane, então, escancarou a porta e abriu caminho para que Julia
e Camilo entrassem.
Era um quarto muito diferente de toda a
casa. Não havia, nele, nada de antigo ou ultrapassado. Ele era todo num tom
claro de rosa com pérola, desde a cama de casal, que ficava no canto esquerdo,
até o guarda roupa. Era tudo muito delicado, o sonho de qualquer garota
adolescente.
Madeleine estava sentada numa poltrona
no canto direito, observando a vida que começava a despertar pelo lado de fora
da janela. Ao lado havia uma escrivaninha cheia de coisas de garota, como
marcações coloridas na tela do computador e livros de romance. O guarda roupa
embutido ficava na parede de onde vinha a porta, de forma que, para sair do
quarto, a impressão que dava é que se entraria no guarda roupa.
- Vocês querem que eu traga mais uma
xícara de café?
- Não, muito obrigado – Camilo disse,
Julia seguiu o marido no palpite.
- Vou deixa-los, então – e dona Jane
fechou a porta.
O silêncio foi total. Madeleine pareceu
nem notar a presença do casal; se notara, eles não faziam a menor diferença.
Ela continuava a observar uma pomba que, audaciosamente, caçava galhos no meio
da rua, desviando-se de um ou outro carro que passava por ali.
- Podemos nos sentar aqui? – Camilo
perguntou, referindo-se à duas cadeiras dispostas frente à moça. Ela acenou com
um sim, sem desviar o olhar.
- Você tem um quarto muito bonito,
Madeleine, com certeza muitas garotas gostariam de um assim. Eu mesma, se eu ainda
fosse jovem, gostaria.
- Obrigada!
Foi então que Madeleine virou-se para os
dois. Seu rosto era jovem, claro, e seus cabelos eram um ruivo escuro natural.
Seu olhar era fundo, de tristeza, e denunciavam que ela já tinha chorado
bastante aquele dia.
- Desculpem-me trazê-los aqui ainda tão
cedo.
- Não precisa pedir desculpas, queremos
ajudar você.
Madeleine voltou a olhar pela janela,
mas, para a sua frustração, a pomba não estava mais lá. Camilo olhou para a
esposa, como que se pedisse ajuda, e Julia ia tentar alguma outra estratégia
novamente, quando foi interrompida.
- Eu estava no meio de todos. Era um dia
de verão, eu me lembro. O sol ardia nas costas, mas ninguém se importava,
porque era um parque muito lindo, como se fosse um imenso jardim. O verde era
de se perder de vista. Eu me lembro de estar como que no lugar mais alto desse
jardim, eu olhava para o horizonte e o verde parecia não acabar. Era muito
grande, e estávamos todos lá. O sol ardia forte, eu ainda posso sentir ele
queimar na minha costa.
- Eu me lembro, também, de um grande
lago que tinha ao longe. Eu não via o fim dele, mas sabia que era um lago. A
água era tão azul! Eu me lembro de ter pensado em nadar nele mais tarde. Estava
com um grupo de amigos, algumas pessoas queridas. Estávamos tendo um dia tão
agradável. Eu gostaria de ter um dia assim.
Camilo e Julia ouviam com muita
presteza.
- Nós havíamos chupado alguns picolés.
Eu me lembro de ter pedido os sabores de uva e leite condensado. Nós havíamos
corrido no campo e contado algumas piadas. Era um dia muito agradável. O sol
era forte, e nós corríamos pelos campos e nunca nos cansávamos. Era um dia
muito agradável.
- Foi então que eu me lembro de ter olhado
para trás, e aquela colina em que outrora eu estava, de onde eu podia ver o
verde sem fim e o lago tão azul, estava longe. Muito longe. Muito mais longe do
que eu me lembro de ter andado. E, em cima dela, eu vi surgir...
O rosto de Madeleine, que até o momento
esboçavam expressões de graciosidade e alegria, pareceu se transformar em
desespero.
- Era um home alto, vestido todo de
branco, e carregava na mão algo que eu não consegui distinguir, porque estava
muito longe. Ele era muito alto, e parecia ser muito bonito. Foi então que eu
me lembro de perceber que aquilo na mão dele era, na verdade, uma instrumento.
E eu vi que era tarde demais.
Uma lágrima escorreu dos olhos de
Madeleine.
-Ele empunhou nos lábios seu instrumento,
e soprou. Eu sabia que ele soprava, eu sabia que ele tocava, mas eu não podia
ouvir. Eu queria ouvir, eu juro que eu me esforçava, mas para mim aquela
trombeta era muda.
- Quando ele começou a tocar, as pessoas
ao meu redor, todas elas, começaram a ser atraídas pelo som que eu não ouvia.
Não sei como explicar, mas elas eram puxadas assim como um imã é atraído pelo
metal. Suas roupas ficavam, e tudo o que elas traziam consigo, óculos, brincos,
aparelhos, tudo ficava, apenas elas eram puxadas e, quando eram puxadas, eu
ouvia que elas davam glórias e aleluias ao Salvador. Mas eu não entedia.
- Eu sentia que algumas delas passavam
por mim, mas eu não saia do lugar. Eu sequer ouvia o som da trombeta –
Madeleine chorava ao descrever as cenas – então eu decidi correr. Eu me lembro
de pensar que, se eu corresse em direção ao anjo, quem sabe ele não me veria e
tocaria para eu ouvir também.
- De alguma forma eu sabia que isso não
adiantaria muito, mas decidi tentar. Saí em disparada para a colina, mas
parecia que, quanto mais eu corria, mas distante o anjo ficava. Eu corri,
corri, corri até me cansar, a depois percebi que nunca tinha saído do lugar.
- Então eu me lembro de olhar ao meu
redor, e não ver mais ninguém. Não havia mais ninguém pra ser chamado, ninguém
pra ser recolhido, e eu vi o anjo sumir do mesmo jeito que apareceu. Eu estava
então sozinha, e me sentia esquecida por Deus. Eu olhava ao meu redor, e apenas
eu estava naquele imenso bosque, sem mais ninguém.
- E quando tudo parecia não poder
piorar, eu vi que o lindo dia de verão começou a se transformar. Nuvens negras
começaram a tomar o céu, todo o verde começou a morrer repentinamente e o lago
virou uma imensa poça de sangue na terra.
- Eu não sei como, mais eu sabia que não
havia mais salvação e que me esperavam apenas dor, destruição e desespero. Eu
chorava. Eu me lembro de chorar muito e desesperadamente. Eu olhava pro céu e
sabia que ele estava fechado, e eu só sabia chorar e chorar. Levaram duas horas
pra que percebesse que era um sonho.
Madeleine olhou novamente para o casal,
e pareceu não encontrar neles a serenidade e paz que encontrara momentos antes.
- Eu não quero ficar, eu não quero!
Aos prantos, Madeleine correu para Julia,
que abraçou a garota e tentava consolá-la, embora estivesse chorando também.
-Acalme-se querida, acalme-se!
- As pessoas não acreditam, pastor –
disse Madeleine – elas não acreditam que Jesus irá voltar. E nessa noite e eu
pude sentir o que elas irão viver quando isso realmente acontecer. Pude sentir
o medo, o desespero, o sentimento de ser esquecido e de ver os céus cerrados
para as nossas orações! E o pior de tudo, o que mais me assombra, é pensar que
isso realmente vai acontecer com bilhões de pessoas.
- Precisamos fazer alguma coisa, pastor!
Esse dia será terrível, tão terrível... oh meu Deus! Eu ainda posso sentir o
medo tomar conta de mim como no sonho. As pessoas precisam saber, elas precisam
ser avisadas que um grande e terrível dia se aproxima! O que vamos fazer? –
Madeleine perguntava olhando para Julia – O que vamos fazer, pastor?
Camilo levantou-se e foi em direção à
janela. Então virou-se para Julia e Madeleine. Ele sabia que elas esperavam a
paz de suas palavras, mas tudo o que disse, foi:
- Vamos orar, Madeleine. Orar para que
Deus desperte-nos para esse tempo. Vamos orar para que nós estejamos preparados
pra subir neste dia, e para que possamos anunciar esse acontecimento a todos.
Se as pessoas vão crer ou não, não podemos saber, isso dependerá de cada um. O
que podemos fazer é orar e pregar. O tempo se aproxima!
“Olhai, vigiai e orai; porque não sabeis quando
chegará o tempo.” Marcos 13:33
Abraços, Deus
abençoe vocês!
Denian Martins.
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