A porta abriu-se e, por traz, surgiu o
rosto de uma senhora outrora simpática, mas que no momento carregava nas
expressões as marcas de muitas preocupações e de uma noite mal dormida.
- Oh! Que bom que os senhores vieram –
Dona Jane limitou-se a dizer, convidando o casal de visitantes para entrarem na
casa.
Por fora, a casa parecia antiquada
naquele bairro moderno. Era uma das únicas que resistira, ainda, às
modernidades e reformas. Ela era uma daquelas antigas, das quais a porta da
frente dava para um pequeno hall de muro baixo acessado por qualquer pessoa, se
não fosse um portãozinho branco de tinta desbotada, daqueles com trava fechada
a cadeado.
Por dentro, entretanto, o assunto era
outro. Era uma sala quadrada confortável e grande, com um jogo de sofás em tons
amarronzados que davam para uma televisão última geração, uma mesa de centro
com uma bela toalha de rendas branca e, na estante da televisão, os mais diversos
itens de decoração, indo desde mini esculturas de cavalos e corujas a
fotografias de famílias e vasos com flores sintéticas.
Da sala conseguia se ver a cozinha, aos
fundos, toda branca e com um canecão de água a ferver. Por trás dos sofás, uma
escada de madeira levava para o segundo andar, por onde dona Jane subira após receber
as visitas.
- Talvez não tenha sido uma boa ideia eu
ter vindo junto.
- Por que você diz isso?
- Às vezes eu acho que mais atrapalho
que ajudo.
- Não diga isso. Você sabe o quanto já
me ajudou, e acredito que me ajudará ainda mais hoje, afinal, ela é uma jovem,
e uma jovem muito reservada – Julia pareceu dar de ombros – e creio que não vá
demorar, se você está preocupada com as crianças.
- Oh perdoem-me ter deixado vocês assim,
sem ninguém, mas precisava ver como ela estava – disse a simpática senhora,
descendo os últimos degraus e já indo em direção à cozinha – eu já estou
passando um cafezinho para vocês, só mais uns cinco minutinhos.
O casal entreolhou-se e sentiu a
necessidade de levantar-se.
- Mas, dona Jane, antes de qualquer
coisa, precisamos saber – Camilo disse, dirigindo-se à cozinha – o que
aconteceu? Pelo telefone não conseguimos compreender muito bem.
A senhora, que derramava a água quente
no pó de café, depositou o canecão na pia, e manteve o olhar ao longe por
alguns segundos, depois ela olhou no rosto do casal e, mais uma vez como em
tantas outras, sentiu a confiança naqueles olhares. Eles já haviam a ajudado
tanto!
- Foi horrível – e abaixou a cabeça – em
sessenta e sete anos de idade nunca tinha visto algo assim. Ela costumava
acalmar-se ao ouvir a voz a mãe quando tinha pesadelos na infância, e até ligar
para a mãe dela eu liguei, mas nada a tranquilizou. Desculpem chama-los assim,
tão cedo, mas depois de horas sem saber o que fazer, foi minha única esperança.
- Não se preocupe – Julia aproximou-se e,
sorrindo, segurou as mãos de Jane – estamos aqui para ajudar, de alguma forma.
Camilo e Julia, então, tomaram o café
que fora servido enquanto Jane foi conferir, mais uma vez, como estavam as
coisas no segundo andar.
- Não te disse? Você tem uma
sensibilidade muito maior para as coisas que eu – Camilo disse, sorrindo.
- Bom – dona Jane se aproximava –
acredito que ela esteja pronta... vocês gostariam de subir?
Camilo e Julia se entreolharam
novamente, e viram que era o momento.
Continua
Continua
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