Festival do Céu: Capítulo V - Uma nova esperança


A sala de reunião da Igreja nunca fora tão frequentada quanto nesse período. A Escola Bíblica Dominical mal acabara, e o Pastor Ludovico, Rick, Lorena e dona Vera se reuniram. Rick e Lorena confusos e nervosos.
- Eles não podem simplesmente impedir a gente – Rick falava.
- Mas é uma cambada de incompetentes mesmo – Lorena sempre fora mais agressiva [vocês sabem rs].
- Vamos convocar o povo, fazer uma revolução, invadir a Prefeitura!
- Filho! Por favor! – às vezes, dona Vera acreditava nas ideias malucas do Rick
Flavinha entrou na sala, desesperada.
- Ai gente, desculpa atrasar, perdi o circular e tive que vir a pé. Nem deu pra chegar a tempo da EBD, mas enfim... e aí pastor? Como foi lá na Prefeitura?
- Bom, como eu já disse ao Rick e à Lorena: como você mesma descobriu, a Igreja não tem alvará pra realizar eventos como um festival de música. Eu e a Vera fomos na Prefeitura pra ver essa situação e acontece que esse tipo de alvará depende de outros documentos, até mesmo de um atestado no Corpo de Bombeiros, e isso pode levar meses. Muito difícil que a gente consiga tudo a tempo!
- Mas, me explica uma coisa pai: a gente já não tem todo esse tipo de alvará?
- Não, a Igreja só pode realizar cultos religiosos. Nada como um festival de música.
- Pelo amor de Deus, gente, e não tem música nos cultos? – Lorena disse, indignada – é quase a mesma coisa! Não é possível.
- Exatamente, Lorena. Eu marquei uma hora pra falar com o secretário de urbanismo pra discutir o assunto, mas ele é muito irredutível na decisão...
- Ah, Ludovico, vamos abrir o jogo – Vera interrompeu – ele pediu propina pra ajudar a Igreja.
- Hmm... – Rick e Lorena fizeram juntos, se entreolhando e lembrando de uma ocasião muito parecida, na realização da primeira cantata de Natal [quem lembra?].
- Sabe, filho – dona Vera segurou a mão do filho, eles estavam sentados lado a lado – será que isso não é um sinal de Deus de que Ele não quer que a gente faça esse festival?
- Parece mais um sinal do capeta tentando atrapalhar... – Lorena sendo Lorena.
- Mãe!! – Rick disse, indignado – você prometeu que ia ajudar a gente, não que ia nos desanimar!!!
- Ai filho, eu vou ajudar. Eu e as meninas vamos vender salgados, Lorena está de prova, mas é que, às vezes, eu penso isso, sabe?
Rick não convenceu-se muito da desculpa dada pela mãe.
- Vamos continuar crendo e orando que, se for da vontade de Deus, Ele dará a solução! – o pastor disse olhando pra esposa, que ficou meio sem graça.
Alguém bateu na porta, e Rick foi abrir.
- E aí, mano? Tudo bom? Preciso falar contigo, tá ocupado? – era Maikão.
Rick hesitou um pouco em sair da reunião, mas na verdade ela já tinha acabado. Maikão puxou Rick pelo braço até um canto, ele encarava Rick de cima abaixo, de uma maneira estranha, nunca tinha feito isso.
- Então, velho, é o seguinte. Eu queria... sei lá, sabe... bom, a Camila tá ajudando aí nesse negócio de festival e... sei lá, não tô sabendo muito bem o que é esse negócio, mas queria ajudar. Tipo, participar das reuniões também, mas de TODAS as reuniões, saca? Tipo, que você não me deixe de fora de nenhuma, NENHUMA, mano. Entendeu?
- Bom... pode participar sim, Maikão, embora eu não saiba se você vá conseguir ajudar muito.
- Por que não posso ajudar? Tu tá me tirando, mano? Você acha que eu sou menos competente que os outros? Que tu?
- Não... - Rick pensou que o líder estivesse brincando, mas ele não estava [mais um ponto estranho naquele estranho diálogo]. Rick explicaria tudo, mas desistiu - você tem algum contato na prefeitura?
- Aí, tá vendo. Tenho, tenho sim... e aí? Sou melhor que você!
Rick se aproximou de Maikão.
- Você tem mesmo?!
***
Flavinha havia esquecido o celular na sala. Lorena estava sentada, sozinha na mesa.
- Ih, bonita, eu bem que queria acreditar que isso é preocupação com o festival – ela sentou-se ao lado da amiga.
- Ah, não é, sabe Flavinha? O Rick anda tão estranho; isso tá me tirando o sono. Parece que ele tá escondendo alguma coisa de mim, e eu não tô conseguindo saber o que é.
- E por que você não chega e pergunta na lata?
- Tá louca, menina. Se ele tá escondendo é lógico que ele não vai contar... ou vai contar uma mentira. Você parece pior que a Camila!
- Bom se eu tivesse namorado, e não tenho não por falta de pretendentes, tá amor, só pra constar; mas então, SE eu tivesse... ah, bonita, comigo ia ser assim, tudo no preto no branco. Tô desconfiando de alguma coisa, já chego na lata. Não tem essa história de lenga lenga comigo não.
Lorena riu.
- É que eu já andei pisando na bola com o Rick há um tempo, sabe? Não quero dar a louca paranoica pra cima dele. E tem outra, talvez possa ser pelo fato de eu ter que me mudar pra capital... eu penso que pode ser por causa disso.
- Meu amor, se você quer descobrir alguma coisa, tem que ser na maciota... como quem não quer nada... eu até aconselho você a dar uma olhada nas coisas dele, celular.... – quando Flavinha disse “celular”, Lorena deu um salto [mesmo sentada] – que é isso, bonita?! Tá doida?!
- É isso! Celular dele. A Clarinha disse que ele ficou muito bravo quando ela pegou o celular dele... se tiver alguma coisa, tem que estar lá! – Lorena, que estava tão animada, pareceu levar um balde de água gelada – Hm... o duro é conseguir pegar esse celular sem ele ver!
- Olha, pra mim é moleza pegar as coisas assim... – Flavinha percebeu que a frase ficou um tanto estranha – quero dizer, não que eu roube coisas.... pelo amor de Deus, não faço isso... é que eu entendo dos paranauê... não me pergunte como, mas entendo. Se você quiser, eu dou essa forcinha..
Lorena riu de novo, e abraçou, agradecendo a amiga.
***
Maikão e Rick desceram do fusca e foram até uma casa naquela movimentada avenida. Era uma república cheia de universitários, onde alguns deles estavam do lado de fora, sentados na calçada [e Rick desconfiou que estivessem fumando].
- Tem certeza que esse cara que você falou vai no culto da mocidade, Maikão? Ainda não lembro dele!
- Tu tá me tirando, né Rick?! Eu sou o líder da mocidade, claro que eu conheço! E tem outra, ele é um cara muito reservado, até hoje não vi falando com ninguém e, se eu mesmo não fosse até ele, nem comigo ele falaria.
Maikão já ia atravessar a avenida quando Rick o puxou de novo.
- Maikão, se ele é “tão reservado” assim, como você garante que ele vai ajudar no festival?
- Eu não garanto nada, velho, mas se a gente não falar com ele, a gente vai falar com quem? Você tem algum contato na prefeitura?
Os dois atravessaram a rua e Maikão foi falar com os jovens sentados na calçada, enquanto Rick esperou um pouco ao longe. Dois rapazes levantaram-se e entraram na casa, e Rick os ouviu chamando por alguém.
Não demorou muito pra surgir na porta uma figura: um rapaz bem aparentado [diferente de seus companheiros de república] com uma barba preta que cobria todo o rosto, cabelos pretos também e óculos. Ao ver Rick e Maikão, o rapaz ficou pálido e arregalou os olhos. Ele pegou os dois pelo braço e os levou pro outro lado da avenida.
- O que vocês dois estão fazendo aqui?!
- Rick, Thomas; Thomas, Rick – Maikão apresentou, Thomas estendeu a mão a Rick, e ficou esperando que Rick o cumprimenta-se, o que obviamente não aconteceu [que jovem se cumprimenta dando a mão hoje em dia?!] - então, velho, a gente veio aqui porque a gente precisa da sua ajuda.
- Da minha?! – Thomas disse tão assustado que a voz falhou [quem é adolescente rapaz sabe como é ruim quando a voz falha assim! Aff...].
- Isso, de você! Mas a gente não pode conversar lá dentro?
- Claro! Q-quero d-dizer, não! É... acho m-melhor não, sabe, eu acho q-que não vai dar muito certo... esses c-caras são muito... in-intrometidos... na conversa dos... outros – Thomas estava tão nervoso à ponto de gaguejar.
- Bom, é o seguinte – e Rick explicou todo o caso, desde a vontade de fazer um festival até o embaraço na prefeitura. Thomas ouvia a tudo, balançando a cabeça freneticamente – como você trabalha na prefeitura, a gente precisaria ver se você consegue conversar lá e ver se consegue agilizar pra gente o alvará, ou se tem alguma forma da gente conseguir antes do dia do festival.
- Cla-claro! – Thomas disse, sem pensar... na verdade, tudo o que ele queria é que Rick e Maikão fossem embora o mais rápido possível, porque, do outro lado da rua, os outros universitários começavam a reconhecer quem eram seus dois companheiros – ajudo sim! P-pode deixar! C-converso s-sim!
Maikão e Rick só faltaram pular de alegria. Thomas somente sorria, bem nervoso.

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